segunda-feira, junho 20, 2005

Não há direitos adquiridos...

Como se vem constatando, não há quaisquer direitos adquiridos. É assim hoje como sempre foi no passado. Só temos os direitos de que não nos deixamos espoliar. A história ensina-nos que sempre assim foi. O que é estranho é que o comum dos mortais não queira aceitar pacificamente esta evidência. As revoluções já lá vão, quem não está bem muda-se e, como sonho para o futuro, a rapaziada da política promete-nos o passado. Acabou o tempo das certezas, que cada um agarre o bocado maior a que possa deitar a mão.

Os já aposentados, supostamente com os direitos adquiridos, vão ver as suas pensões sofrer uma drástica redução com a alteração das regras do IRS, da comparticipação de medicamentos, da inflação e dos filhos desempregados até aos quarenta anos.

Os quase com o direito de aposentação terão alguém a dizer ?desculpe lá o mau jeito, mas já não há nada para ninguém?. Provavelmente o ?desculpe? até ficará de fora.

Os funcionários públicos do futuro, com contratos individuais, é melhor que percebam bem a voz do dono e deixem de dar pareceres negativos a cortes de árvores. Se fossem mais sensíveis às necessidades do poder real até havia menos fogos florestais. Ardiam menos sobreiros, pelo menos.

Vivemos num estado sem palavra. Um aperto de mão já não basta. Mas a crua realidade é que, se tudo se pode desdizer dum momento para o outro, então não pode haver direitos adquiridos. O direito é um compromisso entre gente de bem e, uma vez perdida a confiança, tudo pode ser posto em causa. Se os meus direitos não são reconhecidos e respeitados que obrigação tenho eu de contribuir para aqueles que, com menor contributo para a causa comum, se vão passear enquanto eu trabalho para lhes pagar a reforma?

Aí ponha-se tudo em causa. Recuso-me a pagar para a reforma dos senhores Bagões, dos senhores Cunhas e dos outros todos que, com o sorriso alarve, bem chico-esperto e português, dirão: Eu já cá tenho o meu, os outros que chupem no dedo...

E quem nos garante que na véspera dos nossos sessenta e cinco anos, havendo mais uns estádios para pagar, não nos dirão para termos paciência porque afinal só pode ser aos setenta?

É essa a dúvida razoável que cada português de meia idade pode ter. Mas se é também verdade que se sai mais da caixa do que aquilo que entra rapamos o fundo bem depressa, qual é a solução? A meu ver só existe uma solução que passa por não tratarmos todos os portugueses com paternalismo serôdio que não fica bem no novíssimo século vinte e um. Há não muitos anos alguém dizia que diálogo sem decisão era sinal de impotência, permito-me afirmar que decisão sem diálogo é sinal de prepotência. Nada pior para a economia que avançarmos sem um sentido, sem um propósito, encolhendo a alma e a esperança, sem saber para onde vamos e quais são as regras do jogo.

É que não é um jogo qualquer.

segunda-feira, janeiro 31, 2005

Os Ricos Não Pagam a Crise

Durante os últimos três anos, das duas uma, ou os nossos ricos ficaram todos pobrezinhos, ou pura e simplesmente emigraram para o Brasil.


"Entre 2001 e 2003, houve uma quebra de 92% no número de agregados com rendimentos superiores a 250 mil euros/ano. De acordo com as estatísticas do IRS, reveladas pelas Finanças, eram 26 802 há quatro anos, passando a 2144 há dois anos (ver quadro na página ao lado). Segundo especialistas contactados pelo "jn negócios", há claros indícios de uma evasão fiscal em larga escala, uma vez que a crise económica não pode explicar tudo."

O Mistério dos Riquinhos Desaparecidos, leia a informação...>>>

sábado, janeiro 22, 2005

Ó Veralista

Ainda estudante, lembro-me de um velho cauteleiro, e para os mais novos importa explicar que um cauteleiro vendia cautelas, que não eram cuidados ou protecções várias, nem sequer alguma forma de providência cautelar, muito embora fossem a providência em que muitos punham fé e esperança, à semelhança dos euro-milhões e toto-lotos dos dias de hoje. Mas dizia eu, o pregão do cauteleiro era "ó veralista", o que traduzido queria dizer que tinha a lista dos premiados de lotarias anteriores. Na realidade apregoava uma coisa, mas o que verdadeiramente queria era outra: que lhe comprássemos um duodécimo de um bilhete de lotaria, ou seja, um doze avos de um bilhete inteiro. Para um bilhete inteiro poucos tinham as posses necessárias. E assim, de longe em longe, lá se comprava uma cautela, acto de fé num país cinzento, sem esperança e sem futuro. E chegado o dia de sorteio lá saíam os números, cantados em esperanças sem fim e projectos sem base.

Portugal tem umas longas contas a ajustar com listas e róis. São as listas negras e as listas de eleitores depuradas da outra senhora. São as listas negras de gentes a proscrever ou a afastar. Damo-nos mal com listas. Listas têm primeiro e último e nós somos todos no mesmo lugar. Ou se está ou não se está em listas. Depende. Recentemente tivemos as listas que saem hoje, saem amanhã, listas erradas e listas omissas, listas de colocação, de exclusão, de não colocação. E como temos horror à palavra prioridade, lá estavam todos, uns na certa, outros na errada e outros, pela certa, com o atestadozinho, subindo e descendo na lista. Como disse tão simplesmente a senhora dona, pega-se num candidato e vai-se à lista e pumba, já está. Talvez, há dias de sorte e com jeito lá se fica na lista dos que podem beber a bicazita do emprego à espera de mais outro sorteio.

Nestes dias, são ainda as listas que são notícia. Estás na lista? O quê, tão baixo na lista? Mas sempre é melhor estar na lista, que fora dela. De lista em lista outros saltarão e nunca se sabe quando nos sai a sorte grande. O quê, não fui na quota do Secretário? É um cota, não pesca nada disto. Se me tivesse convidado também não aceitava. Eu sou assim, ou estou, ou também já não quero, vou para outra lista, ou outro rol, ou outra sala, à espera do que sempre tem testo para ela.

Entretanto há também os que querem saber de outras listas. Há listas de compras? De coisas a fazer? Há listas de cortes e quem se corte de fazer as listas ao inimigo. Faça lá a lista que eu corto, mas que não doa. Pelo menos a mim...

(publicado)